CLUBE Militar faz crítica dura às organizações Globo por terem afirmado que apoio ao Golpe de 64 foi um equívoco

O blog de Lino Bocchini, da Carta Capital, traz post interessante sobre a reação do Clube Militar ao recente editoral de O Globo, publicado neste último sábado (31), no qual considera o apoio dado pelas organizações do Sr. Roberto Marinho ao Golpe de 64 um equívoco. Para entidade que reúne oficiais da ativa e ex-militares e promove comemorações da chamada “Revolução” todo dia 31 de março, “Declarar agora que se tratou de um ‘equívoco’ é mentira deslavada”.

Abaixo, o texto do post do Blog de Lino Bocchini.

CLUBE MILITAR CRITICA EDITORIAL “MEA CULPA” DE O GLOBO.
por Lino Bocchini – publicado originalmente 04/09/2013 | Blog do Lino

O Clube Militar, entidade que reúne oficiais da ativa da marinha, do exército e da polícia (e também ex-militares), soltou nestaquarta-feira 4 de setembro uma nota oficial ” Nossa Opinião – Equívoco, uma ova!”, condenando o editorial “Apoio editorial ao golpe de 64 foi um erro”, divulgado pelo jornal O Globo no último dia 31 de agosto. O texto do veículo da família Marinho afirmava que “as Organizações Globo reconhecem que, à luz da História, esse apoio [ao golpe militar] foi um erro”.

O Clube Militar reagiu com firmeza:

“o apoio ao Movimento de 64 ocorreu antes, durante e por muito tempo depois da deposição de Jango; em segundo lugar, não se trata de posição equivocada “da redação”, mas de posicionamento político firmemente defendido por seu proprietário, diretor e redator chefe, Roberto Marinho, como comprovam as edições da época”.

E foi além:

“não foi, também, como fica insinuado, uma posição passageira revista depois de curto período de engano, pois dez anos depois da revolução, na edição de 31 de março de 1974, em editorial de primeira página, o jornal publica derramados elogios ao Movimento; e em 7 de abril de 1984*, vinte anos passados, Roberto Marinho publicou editorial assinado, na primeira página, intitulado “Julgamento da Revolução”, cuja leitura não deixa dúvida sobre a adesão e firme participação do jornal nos acontecimentos de 1964 e nas décadas seguintes.”

* Na verdade o editorial foi publicado em 7 de outubro de 1984, e não em 7 de abril como afirmou o Círculo Militar. Nota de Hum Historiador.

Abaixo, repercutimos a íntegra da nota do Clube Militar, disponível da página da Instituição:

Nossa Opinião – Equívoco, uma ova!

Logotipo do Clube Militar

Logotipo do Clube Militar

Numa mudança de posição drástica, o jornal O Globo acaba de denunciar seu apoio histórico à Revolução de 1964. Alega, como justificativa para renegar sua posição de décadas, que se tratou de um “equívoco redacional”.

Dos grandes jornais existentes à época, o único sobrevivente carioca como mídia diária impressa é O Globo. Depositário de artigos que relatam a história da cidade, do país e do mundo por mais de oitenta anos, acaba de lançar um portal na Internet com todas as edições digitalizadas, o que facilita sobremaneira a pesquisa de sua visão da história.

Pouca gente tinha paciência e tempo para buscar nas coleções das bibliotecas, muitas vezes incompletas, os artigos do passado. Agora, porém, com a facilidade de poder pesquisar em casa ou no trabalho, por meio do portal eletrônico, muitos puderam ler o que foi publicado na década de 60 pelo jornalão, e por certo ficaram surpresos pelo apoio irrestrito e entusiasta que o mesmo prestou à derrubada do governo Goulart e aos governos dos militares. Nisso, aliás, era acompanhado pela grande maioria da população e dos órgãos de imprensa.

Pressionado pelo poder político e econômico do governo, sob a constante ameaça do “controle social da mídia” – no jargão politicamente correto que encobre as diversas tentativas petistas de censurar a imprensa – o periódico sucumbiu e renega, hoje, o que defendeu ardorosamente ontem.

Alega, assim, que sua posição naqueles dias difíceis foi resultado de um equívoco da redação, talvez desorientada pela rapidez dos acontecimentos e pela variedade de versões que corriam sobre a situação do país.

Dupla mentira: em primeiro lugar, o apoio ao Movimento de 64 ocorreu antes, durante e por muito tempo depois da deposição de Jango; em segundo lugar, não se trata de posição equivocada “da redação”, mas de posicionamento político firmemente defendido por seu proprietário, diretor e redator chefe, Roberto Marinho, como comprovam as edições da época; não foi, também, como fica insinuado, uma posição passageira revista depois de curto período de engano, pois dez anos depois da revolução, na edição de 31 de março de 1974, em editorial de primeira página, o jornal publica derramados elogios ao Movimento; e em 7 de abril de 1984, vinte anos passados, Roberto Marinho publicou editorial assinado, na primeira página, intitulado “Julgamento da Revolução”, cuja leitura não deixa dúvida sobre a adesão e firme participação do jornal nos acontecimentos de 1964 e nas décadas seguintes.

Declarar agora que se tratou de um “equívoco da redação” é mentira deslavada.

Equívoco, uma ova! Trata-se de revisionismo, adesismo e covardia do último grande jornal carioca.

Nossos pêsames aos leitores.

Para melhor compreensão do assunto que está sendo abordado, abaixo disponibilizamos a Capa de O Globo com o editorial dando vivas ao movimento dos militares, e o texto na íntegra do editorial de 1964 (Fonte: Pragmatismo Político).

Editorial de O Globo, um dia após o Golpe Militar de 1964.

Editorial de O Globo de 02 de abril de 1964, um dia após o Golpe Militar.

“Ressurge a Democracia”

Vive a Nação dias gloriosos. Porque souberam unir-se todos os patriotas, independentemente de vinculações políticas, simpatias ou opinião sobre problemas isolados, para salvar o que é essencial: a democracia, a lei e a ordem. Graças à decisão e ao heroísmo das Forças Armadas, que obedientes a seus chefes demonstraram a falta de visão dos que tentavam destruir a hierarquia e a disciplina, o Brasil livrou-se do Governo irresponsável, que insistia em arrastá-lo para rumos contrários à sua vocação e tradições.

Como dizíamos, no editorial de anteontem, a legalidade não poderia ser a garantia da subversão, a escora dos agitadores, o anteparo da desordem. Em nome da legalidade, não seria legítimo admitir o assassínio das instituições, como se vinha fazendo, diante da Nação horrorizada.

Agora, o Congresso dará o remédio constitucional à situação existente, para que o País continue sua marcha em direção a seu grande destino, sem que os direitos individuais sejam afetados, sem que as liberdades públicas desapareçam, sem que o poder do Estado volte a ser usado em favor da desordem, da indisciplina e de tudo aquilo que nos estava a levar à anarquia e ao comunismo.

Poderemos, desde hoje, encarar o futuro confiantemente, certos, enfim, de que todos os nossos problemas terão soluções, pois os negócios públicos não mais serão geridos com má-fé, demagogia e insensatez.

Salvos da comunização que celeremente se preparava, os brasileiros devem agradecer aos bravos militares, que os protegeram de seus inimigos. Devemos felicitar-nos porque as Forças Armadas, fiéis ao dispositivo constitucional que as obriga a defender a Pátria e a garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem, não confundiram a sua relevante missão com a servil obediência ao Chefe de apenas um daqueles poderes, o Executivo.

As Forças Armadas, diz o Art. 176 da Carta Magna, “são instituições permanentes, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade do Presidente da República E DENTRO DOS LIMITES DA LEI.”

No momento em que o Sr. João Goulart ignorou a hierarquia e desprezou a disciplina de um dos ramos das Forças Armadas, a Marinha de Guerra, saiu dos limites da lei, perdendo, conseqüentemente, o direito a ser considerado como um símbolo da legalidade, assim como as condições indispensáveis à Chefia da Nação e ao Comando das corporações militares. Sua presença e suas palavras na reunião realizada no Automóvel Clube, vincularam-no, definitivamente, aos adversários da democracia e da lei.

Atendendo aos anseios nacionais, de paz, tranqüilidade e progresso, impossibilitados, nos últimos tempos, pela ação subversiva orientada pelo Palácio do Planalto, as Forças Armadas chamaram a si a tarefa de restaurar a Nação na integridade de seus direitos, livrando-os do amargo fim que lhe estava reservado pelos vermelhos que haviam envolvido o Executivo Federal.

Este não foi um movimento partidário. Dele participaram todos os setores conscientes da vida política brasileira, pois a ninguém escapava o significado das manobras presidenciais. Aliaram-se os mais ilustres líderes políticos, os mais respeitados Governadores, com o mesmo intuito redentor que animou as Forças Armadas. Era a sorte da democracia no Brasil que estava em jogo.

A esses líderes civis devemos, igualmente, externar a gratidão de nosso povo. Mas, por isto que nacional, na mais ampla acepção da palavra, o movimento vitorioso não pertence a ninguém. É da Pátria, do Povo e do Regime. Não foi contra qualquer reivindicação popular, contra qualquer idéia que, enquadrada dentro dos princípios constitucionais, objetive o bem do povo e o progresso do País.

Se os banidos, para intrigarem os brasileiros com seus líderes e com os chefes militares, afirmarem o contrário, estarão mentindo, estarão, como sempre, procurando engodar as massas trabalhadoras, que não lhes devem dar ouvidos. Confiamos em que o Congresso votará, rapidamente, as medidas reclamadas para que se inicie no Brasil uma época de justiça e harmonia social. Mais uma vez, o povo brasileiro foi socorrido pela Providência Divina, que lhe permitiu superar a grave crise, sem maiores sofrimentos e luto. Sejamos dignos de tão grande favor.”

Por fim, o Hum Historiador também gostaria de adicionar ao post, o referido editorial de 07 de outubro de 1984, assinado pelo Sr. Roberto Marinho, e que foi referido pelo Clube Militar em sua resposta a O Globo para destacar a defesa que o proprietário das Organizações Globo fazia do “movimento revolucionário” mesmo 20 anos após o Golpe ter sido perpetrado.

Abaixo a transcrição na íntegra do editorial de Roberto Marinho, publicado na edição de 7 de outubro de 1984 de O Globo.

Detalhe da capa de O Globo, de 7 de Outubro de 1984. Fonte: O Globo.

Detalhe da capa de O Globo, de 7 de Outubro de 1984. Fonte: O Globo.

JULGAMENTO DA REVOLUÇÃO
Roberto Marinho

PARTICIPAMOS da Revolução de 1964, identificados com os anseios nacionais de preservação das instituições democráticas, ameaçadas pela radicalização ideológica, greves, desordem social e corrupção generalizada. Quando a nossa redação foi invadida por tropas anti-revolucionárias, mantivemo-nos firmes em nossa posição. Prosseguimos apoiando o movimento vitorioso desde os primeiros momentos de correção de rumos até o atual processo de abertura que deverá consolidar-se com a posse do futuro presidente.

TEMOS permanecido fiéis aos seus objetivos, embora conflitando em várias oportunidades com aqueles que pretenderam assumir a autoria do processo revolucionário, esquecendo-se de que os acontecimentos se iniciaram, como reconheceu o Marechal Costa e Silva, “por exigência inelutável do povo brasileiro”. Sem povo, não haveria revolução, mas apenas um “pronunciamento” ou “golpe” com o qual não estaríamos solidário.

O GLOBO, desse a Aliança Liberal, quando lutou contra os vícios políticos da Primeira República, vem pugnando por uma autêntica democracia e progresso econômico e social do País. Em 1964, teria de unir-se aos companheiros de jornadas anteriores, aos “tenentes e bacharéis” que se mantinham coerentes com as tradições e os ideais de 1930m aos expedicionários da FEB que ocupavam a Chefia das Forças Armadas, os quais se congregaram sob a pressão das grandes marchas populares, mudando o curso da nossa história.

ACOMPANHAMOS esse esforço de renovação em todas as suas fases. No período de ordenação da economia que se encerrou em 1967. Nos meses dramáticos de 1968 em que a intensificação dos atos de terrorismo provocou a implantação do AI-5. Na expansão econômica de 1969 a 1972, quando o produto nacional cresceu à taxa média anual de 10%. Assinale-se que, naquele primeiro decênio revolucionário, a inflação decrescera de 96% para 12,6% ao ano, elevando-se as exportações anuais de 1 bilhão e 300 mil dólares para mais de 12 bilhões de dólares. Na era do Impacto da crise mundial do petróleo desencadeada em 1973 e repetida em 1979, a que se seguiram aumentos vertiginosos nas taxas de juros, impondo-nos uma sucessão de sacrifícios para superar nossa dependência externa de energia a deterioração dos preços dos nossos produtos de exportação e a desorganização do sistema financeiro internacional. Essa conjugação de fatores que violentaram a administração de nossas contas externas obrigou-nos a desvalorizações cambiais de emergência que teriam fatalmente de resultar na exacerbação do processo inflacionário. Nas respostas que a sociedade e o governo brasileiros deram a esses desafios, conseguindo no segundo decênio revolucionário que agora se completa, apesar de todas as dificuldades, reduzir de 80% pra menos de 40% a dependência externa na importação de energia, elevando a produção de petróleo de 175 mil para 500 mil barris diários e a de álcool, de 680 milhões para 8 bilhões de litros; e simultaneamente aumentar a fabricação industrial em 85%, expandir a área plantada para produção de alimentos com 20 milhões de hectares a mais, criar 13 milhões de novos empregos, assegurar a presença de mais de 10 milhões de estudantes nos bancos escolares, ampliar a população economicamente ativa de 29 milhões e 500 mil para 45 milhões 797 mil, elevando as exportações anuais de 12 bilhões para 22 bilhões de dólares.

VOLVENDO os olhos para as realizações nacionais dos últimos vinte anos, há que se reconhecer um avanço impressionante: em 1964, éramos a quadragésima nona economia mundial, com uma população de 80 milhões de pessoas e uma renda per capita de 900 dólares; somos hoje a oitava, com uma população de 130 milhões de pessoas, e uma renda média per capita de 2.500 dólares. 

* * *

O PRESIDENTE Castello Branco, em seu discurso de posse, anunciou que a Revolução visava “a arrancada para o desenvolvimento econômico, pela elevação moral e política”. Dessa maneira, acima do progresso material, delineava-se o objetivo supremo da preservação dos princípios éticos e do restabelecimento do estado de direito. Em 24 de junho de 1978, o Presidente Geisel anunciou o fim dos atos de exceção, abrangendo o AI-5, o Decreto-Lei 477 e demais Atos Institucionais. Com isso, restauravam-se as garantias da magistratura e o instituto do habeas-corpus. Cessava a competência do Presidente para decretar o fechamento do Congresso e a intervenção nos Estados, fora das determinações constitucionais. Perdia o Executivo as atribuições de suspender direitos políticos, cassar mandatos, demitir funcionários civis e reformar militares. Extinguiam-se as atividades da G.G.I. e o confisco sumário de bens. Desapareciam da legislação o banimento, a pena de morte, a prisão perpétua e a inelegibilidade perene dos cassados. Findava-se o período discricionário, significando que os anseios de liberalização que Castello Branco e Costa e Silva manifestaram e diversas ocasiões e que Médici vislumbrou em seu primeiro pronunciamento finalmente se concretizavam.

ENQUANTO vários líderes oposicionistas pretenderam considerar aquelas medidas fundamentais como “meros paliativos”, o então Deputado Tancredo Neves, Líder do MDB na Câmara Federal, reconheceu que a determinação governamental “foi além do esperado”.

AO ASSUMIR o Governo, o Presidente Figueiredo jurou dar continuidade ao processo de democratização. A concessão da anistia ampla e irrestrita, as eleições diretas para os Governos dos Estados, a posse dos eleitos, a colaboração federal com os novos Governos oposicionistas na defesa dos interesses maiores da coletividade são demonstrações de que o Presidente não falou em vão.

NÃO HÁ memória de que haja ocorrido aqui, ou em qualquer outro país, que um regime de força, consolidado há mais de dez anos, se tenha utilizado do seu próprio arbítrio para se auto-limitar, extinguindo os poderes de exceção, anistiando adversários, ensejando novos quadros partidários, em plena liberdade de imprensa. É esse indubitavelmente, o maior feito da Revolução de 1964. 

* * *

NESTE momento em que se desenvolve o processo da sucessão presidencial, exige-se coerência de todos os que têm a missão de preservar as conquistas econômicas e políticas dos últimos decênios.

O CAMINHO para o aperfeiçoamento das Instituições é reto. Não admite desvios céticos, nem a afastamentos do povo.

ADOTAR outros rumos ou retroceder para atender a meras conveniências de facções ou assegurar a manutenção de privilégios seria trair a Revolução no seu ato final.

Abaixo, link para página do Globo contendo a íntegra do recente editorial considerando um equívoco o apoio editorial ao Golpe.

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