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Eu, mulher, feminista, sua mãe, sua filha, já fui estuprada

Por Flávia Cláudia, historiadora.
Publicado originalmente no Palavra Dita | 27.mai.2016

A cada 11 minutos uma mulher é estuprada no Brasil e, diferente de pegar catapora, ter sido estuprada uma vez não faz de ninguém imune à possibilidade de ser estuprada novamente. Essa semana no mesmo dia em que um estuprador confesso foi recebido pelo Ministério da Educação com a proposta de combater a chamada ideologia de gênero nas escolas viralizou na internet o vídeo de uma garota de 17 anos sendo estuprada por vários homens, mais de trinta, em meio a risos, piadas e toda sorte de crueldades. Desacordada, machucada, humilhada, levada a categoria de uma coisa, um trapo humano.

Pessoalmente não tenho palavras que possam expressar o que sinto pelo fato de que, dos 30 homens, nenhum tenha posto a mão na consciência e dado um fim àquela monstruosidade, de que dos 30 nenhum tenha nem mesmo se recusado a participar da violência. Não é novidade que o estupro, que nós feministas não nos cansamos de afirmar que não é sobre sexo, é sobre poder, sobre opressão, está entranhado no nosso cotidiano na cultura do estupro, ainda posta em dúvida e negada. No entanto, cada vez que um caso com tamanha brutalidade ganha repercussão, o debate retorna aos mesmos pontos, a culpabilização da vítima, a suposição de que não tenha havido estupro e a espantosa subnotificação, hoje avaliada por meio de estatísticas como algo em torno de 10% dos casos. Também enquanto militante, já tive muitas discussões no interior do movimento devido ao discurso de que “denunciar não dá em nada” que penso, desestimula as mulheres a denunciarem seus estupradores e procurarem ajuda, o que pode ser a diferença entre a vida e a morte.

Por mais que doa (e sempre dói) me expor publicamente e falar sobre o estupro como algo que aconteceu comigo, penso hoje que o primeiro movimento para romper a barreira da baixíssima taxa de denúncias desse crime desumanizante seja acabar com o silêncio. Não vejo outra saída senão toda e cada mulher que já passou por isso expor o seu caso. Toda vez que o assunto do estupro vem à tona, alguém traz o comentário de que “e se fosse com a sua irmã, a sua filha…”. Colocar as coisas nesses termos está errado, porque desconhece a mulher como um ser humano que merece empatia por si só. No entanto, esse é o único modo de sensibilizar algumas pessoas para o fato de que aconteceu com uma pessoa e pouco importa se é um dos seus entes queridos ou não. De qualquer modo o caso é que é sim, com as mulheres que estão à sua volta, sua tia, sua irmã, sua prima, só que você não sabe porque ela não contou para ninguém.

No dia do meu aniversário de 29 anos comecei a viver o que seria sem dúvida o pior ano da minha vida, passei meses vivendo no inferno, um ano em que por diversos momentos pensei que não sairia viva, naquele dia fui estuprada e agredida por um homem enquanto a mulher dele me xingava e filmava com o celular, o medo de tudo aquilo ir parar na internet, a minha mãe saber, a imagem dele me segurando pelos cabelos, todas essas imagens e outras piores ficarão escarificadas na minha memória até o fim dos meus dias, um homem. E penso, TRINTA HOMENS, trinta… E uma garota de 17 anos.

Eu já havia passado por abuso sexual na infância, mas era uma lembrança longínqua, do passado, agora eu era uma mulher feita, militante e sabia dentro de mim o que devia ser feito, denunciar. Assim que estive de volta em posse do meu celular (que ele obviamente havia me tomado) liguei para a polícia e todo o processo de denúncia começou. E é sobre isso que eu pretendo falar, sobre a denúncia, porque como sempre digo, a minha militância é sobre as minas, com as minas e para as minas. Esse texto pode e deve ser lido por toda e qualquer pessoa, mas é principalmente para quem já passou ou pode ainda passar por isso e para aquelas pessoas que ainda acham que o estupro é um crime abstrato, que acontece em uma realidade distante, com mulheres que não sabemos quem são. É com as mulheres que vocês e lidam todos os dias, vocês talvez só não saibam. Não raramente nem elas mesmas sabem que aquele dia, aquela vez, aquele cara, aquele “não” que ele fingiu que não ouviu, aquele sexo dormindo que ela pensou que era melhor deixar, aquela “tentativa”, aquilo foi um estupro. Em caso de dúvida, existem centenas de relatos em muitos blogs feministas onde as mulheres escrevem contando de suas experiências, ler sobre ajuda a não se sentir tão sozinha, porque você não é a única. Pessoalmente eu sempre indico o Blog da Lola.

Chamei a polícia pelo 190, como acredito que qualquer um teria feito. A viatura veio depois de uns minutos. Mesmo eu estando na portaria do prédio onde tudo aconteceu, os policiais me disseram que não poderiam subir pois a situação não configurava um flagrante e que eu deveria ir a pé à delegacia mais próxima. Óbvio que eles não subiriam em um prédio de classe média, em um bairro de classe média para fazer fazer uma ocorrência de estupro assim, não é mesmo? Fui a pé até a primeira delegacia que por um acaso eu sabia onde ficava, lá não havia um delegado de plantão, pois era um domingo de manhã, me indicaram onde era a delegacia com delegado plantonista e me disseram que fosse sozinha. Infelizmente as delegacias da mulher não funcionam aos finais de semana. Pois bem, no meio do caminho consegui uma carona em uma viatura, caridade, informal, me deixou na esquina da DP, não poderia me deixar na porta porque não era uma ocorrência dele, foi assim, uma cortesia para me ajudar. Desde o primeiro instante, o trâmite é feito de maneira que a vítima desista, desista por todos os motivos, por que está cansada, porque quer ir para casa esquecer o que aconteceu, porque sente medo de “o que será que vai acontecer agora”, porque não sabe, dependendo de onde o crime aconteceu, ir até a delegacia sozinha, porque não conhece a região ou porque está confusa ou porque precisa de apoio. Mas não desista, não vá para casa. 

Uma das coisas que me deram mais força para seguir adiante foi o fato de que se daquela vez havia sido comigo, sabe deus com quantas outras mulheres ele já tinha feito aquilo e com quantas outras ainda faria, não era só sobre mim, é sobre todas as mulheres que cruzarem o caminho dele também. Na delegacia prestei o meu depoimento no saguão, sem sala privativa, sem um copo de água, em pé, falando em voz alta por quais orifícios do meu corpo tinha sido invadida e se havia bebido ou não, se trabalhava ou não, em que era formada, o que eu tinha ido fazer ali, o de sempre, enquanto pessoas entravam e saiam, passando por mim e ouvindo detalhes sórdidos de algo que eu mesma ainda estava tentando entender, enquanto reconstituía os detalhes que o escrivão digitava. É horrível. Sim, é horrível. O tratamento dado está errado? Completamente errado, o tratamento adequado é que seja dado à vítima privacidade, respeito, confiança.

Ainda assim, quanto mais eu via que todo o processo estava sendo feito completamente errado mais forças eu tirava para levar adiante aquela denúncia. Discuti com o policial, perguntei se beber era ilegal, se não estar trabalhando era ilegal, ou se isso desqualificava a minha denúncia, ele bufou e retomou o seu trabalho. Mesmo que ele repetisse para mim mais de uma vez “Tem certeza que você vai fazer isso? Essa é uma denúncia muito séria…”. Prossegui, uma assistente social veio me levar ao hospital, para fazer o corpo de delito e tomar a medicação. Sim, a sensação é de que está todo mundo olhando para você, provavelmente algumas daquelas pessoas até ouviram mesmo parte do que você falou. Se você passar por isso, prossiga, não se importe com os olhares, você está fazendo a coisa certa. Ele fez a errada. Estatísticas apontam que, com muita frequência, os estupros são cometidos por pessoas do convívio da vítima, o que obviamente torna todo o processo da denúncia ainda mais complicado e inseguro. Da minha parte, cabe a nós militantes tornar o ambiente seguro para que as vítimas possam denunciar.

No hospital a vítima, no caso eu, é encaminhada para o exame de corpo de delito. Atenção: você não é legalmente obrigada a fazer o exame de corpo de delito em nenhuma hipótese. No meu caso, achei por bem fazer porque senti que precisava de todas as provas que eu conseguisse de que aquilo realmente havia acontecido, de que eu não era uma bêbada maluca que inventou uma história absurda para manchar a imagem de um homem de respeito e de sua esposa. Foi deprimente sim, foi doloroso inclusive, e muito, mas muito constrangedor. São tiradas fotografias e é coletado material da região genital. Acho importante, o estupro é um crime dificílimo de ser comprovado, é a sua palavra contra a palavra do agressor. Resista, erga a cabeça, e tenha certeza de que, de todas as dores que você já passou, as que envolvem a denúncia e o tratamento preventivo são as únicas necessárias.

No calvário das dores ainda haverá injeções de antibióticos, pílula do dia seguinte e medicação preventiva para HIV. Esse é o momento em que a você vai se proteger de consequências ainda piores, cuidar de você. Tome. Os dias seguintes dessa medicação serão horríveis, mas você vai ser assistida com todos os remédios que precisar para passar por isso da melhor forma possível. Em São Paulo o hospital que cuida dessa parte é o hospital Pérola Byington, que é um hospital especializado em saúde da mulher e esse tipo de violência. O atendimento existe e funciona, custeado pelo SUS, há ginecologistas que farão uma bateria de exames, todos, assistentes sociais que ouvirão o seu caso e psicólogos que poderão atendê-la caso você ache necessário.

Não é preciso fazer o boletim de ocorrência para ser atendida no hospital, as assistentes sociais estão orientadas a oferecer tratamento e acompanhamento mesmo nos casos em que não há BO. Há profissionais preparadas para atender as vítimas de violência sexual. Tanto pelos médicos, quanto pelas assistentes sociais e psicólogos, em todo momento fui tratada com respeito, paciência e discrição. O atendimento é rápido, o agendamento de consultas relativamente ao tempo geral que se leva para atendimento no SUS é rápido também.

Além do acompanhamento psicológico que fiz no AVS, o núcleo de atenção à mulher em situação de violência sexual do Pérola também fiz acompanhamento psiquiátrico no Programa para vítimas de violência do departamento de psiquiatria da Unifesp.

Tenho duas amigas que após terem sido estupradas tentaram suicídio e ficaram internadas por meses em hospitais psiquiátricos, estupro é coisa séria, não tenha medo de pedir ajuda, caso ache que precisa, você passou por uma situação horrível e que pode ter consequências devastadoras, não deixe que uma monstruosidade acabe com a sua vida ou com a sua sanidade. Você pode e você terá a sua vida de volta. Esses dois programas eu mesma usei e posso garantir que funcionam, com suas dificuldades, mas funcionam. Se você foi vítima de violência, os procure. Não acredite em quem disser que a denúncia não vai dar em nada, que não existe atendimento para a vítima de violência sexual, que a única coisa que você vai conseguir é ser julgada e condenada por todo mundo. vai ser difícil, vai ser horrível, mas tem muita gente que está disposta a ajudar. Não se esconda, não deixe que a violência prossiga ou acabe com a sua vida.

Há muitos coletivos feministas que podem amparar e orientar você nesse momento. Pessoas a quem você poderá contar e que irão ampará-la. Conte a quem ache que deve contar e não conte para quem possa humilhá-la ou tentar fazê-la desistir de ir a diante com a queixa. também sofri pressão para retirar a queixa e não retirei. Repeti para mim mesma que, independentemente do quanto fosse doloroso ou complicado eu não deixaria que ele seguisse pensando que o que ele fez foi certo.

Pessoalmente acho que perdemos tempo demais convencendo homens de que o estupro existe e pessoas de que é errado (Convenhamos, se tem uma coisa que os conservadores sabem fazer é se apropriar do discurso de combate ao estupro quando lhes convém falar em redução da maioridade penal, castração química ou a liberação do porte de armas) e a maior parte do tempo esquecemos que há vítimas que precisam de ajuda, mulheres que não têm a menor ideia de por onde começar. Perdemos um tempo crucial repetindo que denunciar estupros não dá em nada, perdemos tempo compartilhando vídeos de violência sexual, até ingenuamente em vez de simplesmente denunciar o conteúdo e acolher a vítima.

Da minha parte já se passaram dois anos, o processo segue em segredo de justiça, mas o Ministério Público avaliou que há indícios e materialidade de provas, acolheu a denúncia.

Minha vida seguiu.

Por fim, seguem links de denúncia para conteúdo criminoso na internet, não compartilhem, denunciem e só.

Link 1

Link 2

Link 3

Para todos os outros mimimis compartilho a sequência de links que recebi no Facebook, reflitam:

“Se ela estivesse estudando isso não aconteceria!”
Menina estuprada em escola de São Paulo reconhece agressores

“Se ela estivesse na igreja isso não aconteceria!”
Jovem é estuprada dentro de secretaria de igreja em Brasília

“Se ela estivesse em casa isso não aconteceria!”
Morre jovem encontrada com sinais de estupro dentro de casa na Zona Norte

“Se ela estivesse trabalhando isso não aconteceria!”
Jovem é atacada e estuprada a caminho do trabalho

“Se ela tivesse um namorado fixo isso não aconteceria!”
“Meu namorado me estuprou por um ano enquanto eu dormia”

“Se ela fosse mais família isso não aconteceria!”
Adolescente com deficiência física é estuprada pelo tio em RR

“Se ela fosse menos ‘puta’ isso não aconteceria!”
Menina (de 1 ano e meio) morta em igreja foi violentada

“Se ela tivesse mais cuidado isso não aconteceria!”
Jovem é estuprada em estação do Metrô de São Paulo

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Os outros são um inferno

por Liana Machado especialmente para o Hum Historiador

Recentemente um casal de amigos passou por uma situação lastimável. De repente seu filhinho, de apenas 9 anos, passou de bonzinho a extremamente agressivo. Por um tempo ficou deprimido, sem querer falar com ninguém. Depois de muita insistência ele disse à mãe que vinha sofrendo bullying por causa de sua orelha. Eu, sinceramente, nunca havia reparado, mas as crianças não deixam passar nada. Orientados pela psicóloga, resolveram fazer uma cirurgia corretiva a fim de minimizar o problema. Nem vou entrar no mérito de repensar o papel dessa profissional, que ao invés de nos ajudar a lidar com nossas frustrações e nos fazer compreender que jamais seremos como o mundo quer que a gente seja, nos orienta a mudar nosso corpo para  nos adaptarmos. Que mundo maluco  é esse onde uma criança de 9 anos está  a tal ponto preocupada com sua aparência e com um desejo enorme de se enquadrar, que faz com que ela se submeta a uma cirurgia para mudar o corpo?  A cirurgia em si é simples, mas em termos psicológicos e simbólicos o impacto é enorme. À ele foi dito: “sim menininho, você tem um problema”, e sim, “você é o culpado por ele”. O que mais me irritou nessa história é que o garoto mudou o corpo, mas e seus agressores? Me irrita o fato de saber que contra eles, contra os verdadeiros culpados, nada foi feito, e saíram ilesos como Deuses do Olimpo de corpos perfeitos. Achei um absurdo na hora, mas ruminei depois.

Outro fato. Na eminência de ataques a grupos de minorias na “democrática” Augusta, a Folha orientou a gays que não fossem gays (veja a imagem aqui https://www.facebook.com/photo.php?fbid=435333726596918&set=a.116175281846099.19107.100003608837206&type=1&theater). O conselho foi para que não dessem pinta. Esse jornaleco de quinta perdeu (mais uma vez) a oportunidade de enfrentar o problema do preconceito de frente. De novo a vitima potencial se esconde para não ser agredida. Esqueceu a Folha de todos os anos de luta que os grupos LGBTTTs passaram tentando dar visibilidade a causa? Talvez a passeata Gay seja hoje motivo de festa e balada, mas ela já foi o centro irradiador de debate político muito importante contra o preconceito. Então a gente se esconde?

Terceiro, uma vez o Roger e eu discutíamos a implementação de vagões, no metrô do Rio de Janeiro, só para mulheres. O objetivo do governo era diminuir o assédio sexual. Bizarro, não? Ao invés de promover uma campanha veiculada para os homens, para dizer “hei cara, isso não é legal”, “isso não faz de você mais homem”, ou sei lá o que, preferiu-se mais uma vez esconder a vítima. Sem contar que a implementação dos tais vagões pode aumentar o número de assédios, já que se uma mulher não estiver no tal vagão, é porque está querendo… Sim, somos culpadas! Quando ele me perguntou se eu usaria o vagão de mulheres, assim de supetão, eu disse que sim. Claro que repensando depois achei um absurdo ter sequer cogitado isso. Mas meu erro de cálculo tem algo de natural.

Quarto. Ninguém discute a importância da Lei Maria da Penha. Certo? Certo. Mas devemos lembrar que a lei só protege mulheres que dão queixa. Ou seja, quando há agressão, a mulher deve sair de casa levando seus filhos, mudar de vida, mudar de emprego, de grupo social. E quando ela não faz nada disso? Bom então aí ela gosta. Culpadas de novo! Ao homem agressor, que muitas vezes é o provedor e um ótimo pai, nada é dito até que ele responda penalmente. Em termos gerais, tudo depende da vítima.

Todos esses casos são muito lastimáveis. Agonisticamente lastimáveis. Por certo que eu não concordo com a Folha de que as pessoas devam se esconder, nem tão pouco que deva haver vagões para mulheres. Também a Lei Maria da Penha é importantíssima, e levantou o debate. Mas só isso não é suficiente. Não é a vítima que tem mudar, é o agressor! Nosso papel enquanto pensadores, educadores, médicos e políticos é promover uma luta incessante contra o ataque aos direitos humanos, uma luta incessante pelo direito de ser quem somos.

Mas em termos práticos, o que fazer num mundo tão cruel com as diferenças? Como reagir diante de uma situação de preconceito onde você é o agredido? Talvez seja exatamente o motivo pelo qual inicialmente respondi que usaria os vagões “especiais”. Estratégia de sobrevivência? Será que podemos condenar pais que só querem proteger seu filho? Como munir as crianças contra tamanha pressão social? Muito lastimável tudo isso. Porque eu sei que é o agressor que deve pagar, mas no fundo a gente só quer sobreviver…


Liana Machado é historiadora e está concluindo seu mestrado, também em História, pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

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Estupro coletivo como punição a uma jovem indiana

E novamente a Índia causa repulsa internacional por crimes praticados pela própria estrutura administrativa de uma região, contra suas mulheres.

Distrito de Subalpur, leste da Índia

Segundo notícia veiculada pela Agência Brasil, uma jovem indiana de vinte anos de idade foi punida por um conselho comunitário em localidade no leste da Índia a ser estuprada por doze, isso mesmo, doze homens. O “crime” cometido que levou a tal infração foi uma relação amorosa que a jovem mantinha com um rapaz de outra comunidade. Segundo a notícia, o conselho local ordenou a punição na noite dessa última terça-feira (21), após terem realizado uma reunião de emergência em Subalpur (Sambalpur em inglês).

Na segunda-feira (20), os pais da jovem alegaram que não podiam arcar com os custos da multa prevista por essa infração. A notícia ainda dá conta de que, na noite em que a punição foi decidida, tanto a jovem quanto seu parceiro foram amarrados a duas árvores em uma praça local.

Apenas mais um exemplo de sociedades cujas próprias estruturas administrativas praticam crimes contra a mulher.

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O machismo cotidiano que jamais para de transformar suas vítimas em culpadas

Volto a trazer péssimas notícias sobre a maneira como a sociedade trata as vítimas de machismo. Suzane Jardim, aquela estudante da USP que foi atirada pela janela de um prédio de quatro andares porque chamou um homem de machista, está sofrendo uma nova onda de ataques, dessa vez, de pessoas que estão no conforto do seu lar (ou escritório), julgando-a pela Internet e transformando-a em culpada pela agressão que sofreu.

Nesse post, reproduzirei alguns dos comentários que a notícia sobre o ocorrido com a Suzane recebeu no portal do G1. Embora saibamos que comentários de notícias da Internet são sempre espaços abertos para o ódio, é triste ver que mesmo em um caso claro no qual Suzane é a vítima, ela acaba sendo culpabilizada por ter sido vítima de uma agressão. É o machismo cotidiano fazendo o que sabe fazer de melhor, isto é, transformar suas vítimas em culpados.

Como disse Suzane em seu desabafo numa rede social, o objetivo ao postar esses comentários hediondos, é mostrar o que pensa o “cidadão de bem” sobre o que ocorreu com ela. Flagrar o pensamento machista que grassa em nossa sociedade e que não hesita em aparecer quando há um espaço no qual ele pode se manifestar sem amarras.

Abaixo, a reprodução do desabafo de Suzane Jardim numa rede social ao tomar conhecimento dos comentários feitos pelos visitantes do portal G1 sobre a notícia da tentativa de homicídio que ela sofreu e que foi veiculada naquele portal.

DESABAFO DE SUZANE JARDIM

Taí a explicação do que aconteceu comigo na voz do “cidadão de bem”, sempre “muito bem informado”.

Ser mulher é uma enorme de uma bosta e se você fazer qualquer coisa pra mudar isso, terá que lidar com esse tipo de coisa.

Não, não nasci pra esse mundo…

ALGUNS COMENTÁRIOS QUE A NOTÍCIA DA TENTATIVA DE HOMICÍDIO DE SUZANE RECEBEU NO PORTAL DO G1

“18 anos e já mãe solteira , depois saiu naquela noite pra ficar ( meter ) com o amigo , depois vão pra boteco encher a cara …..! Boa parte da mulherada não se da valor e respeito , então não podem se queixar !”

“Se estivesse em casa cuidando do filho de 4 anos, nada disso teria acontecido, vamos procurar chifre em cabeça de cobra, as vezes se acha”

“Se eu tivesse uma namorada feia desse jeito eu também já a teria jogado do prédio.”

“conheceu o cara na rua e já foi entrando no apartamento dele com mais um casal, bem feito.”

“Tambem, vai ficando com qq um que nem conhece, bebum ainda por cima. Ta querendo o que? Beber junto? Quando nem a mãe suporta, é osso. Deu nisso. Ja que tem filho porque nao sai da aula e vai la ficar com ele? Larga pros pais tomarem conta. Vê se acorda.”

“Já sei! Ele bebeu pra tomar coragem e pegar essa coisa feia. Daí passou o efeito, ele se arrependeu, ficou com raiva e tentou matá-la pra ninguém ficar sabendo que ele pegou e zuarem com ele.”

“Certamente, não ficaram só na cervejinha.”

“Desententimentos entre nóias… só isso!”

“Generalizar é burrice, mais se tratando de uma aluna da USP não da pra confiar 100% na história!”

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