Carta do professor Renato Ortiz após cartaz fascista ameaçar alunos, professores e funcionários do IFCH

Alunos, professores e funcionários do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp, em Campinas, foram ameaçados por um cartaz afixado ao lado de uma das escadas do prédio, trazendo os seguintes dizeres: “Morte aos comunistas do IFCH da Unicamp, seus parasitas, vão trabalhar”.

Morte Comunistas UNICAMP

Cartaz fascista afixado no IFCH, UNICAMP. Fonte: Carta Campinas.

Em resposta à mais esta ameaça, um dos professores do Instituto, Ricardo Ortiz, escreveu uma carta aos colegas, que foi publicada em rede social.

Abaixo segue a transcrição, na íntegra, da carta escrita pelo professor Renato Ortiz aos seus colegas do IFCH.

CARTA AOS COLEGAS DO INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
por Renato Ortiz

“Morte aos comunistas do IFCH”. A frase estava escrita na parede de entrada do prédio da direção do Instituto de Filosofia. O lugar escolhido era estratégico, ao subir as escadas a mensagem podia ser vista no seu brilho ofuscante. Minha reação foi de espanto, permaneci imóvel diante do texto, nunca havia visto algo assim em minha vida universitária. No dia seguinte, ao chegar no Instituto, os dizeres tinham sido apagados.

“Morte aos comunistas”. A segunda parte da frase é genérica não tem intenção de ser precisa. Dificilmente, após o colapso da União Soviética, ela poderia dirigir-se àqueles que se consideram “comunistas”. Não, o termo possui uma conotação polissêmica: “esquerda”, “canalha”, “safado”, “petista”, “corrupto”. A denominação deve ser suficientemente ampla para dar a impressão que a pessoa que escreve situa-se na condição fictícia de que é possível falar “contra todos”.

Ela estaria indefesa, ameaçada pelas forças estranhas que a rodeiam. A primeira parte da sentença é, no entanto, clara, límpida, lembra a palavra de ordem do fascismo: morte. Não há nenhuma dubiedade no que é dito: os adversários devem ser aniquilados.

Creio que foi precipitado apagar o grafitti. Ele deveria, temporariamente, permanecer no muro, vestígio e testemunho da estupidez que nos cerca. Temos a ilusão que a universidade, um lugar de liberdade e debate, estaria ao abrigo dessas coisas. Engano. As fissuras sociais nos atingem diretamente.

Existe atualmente na sociedade brasileira um clima explícito de cretinice, ela não se envergonha de si mesmo, orgulhosa, torna-se pública, revelando sua face distorcida. Pior, não se contenta em circunscrever-se aos espaços dos partidos ou dos movimentos políticos, invade o quotidiano, as conversas, amizades, relações de trabalho.

A intolerância sente-se confortável, à vontade para se apresentar como um código moral duvidoso. “Morte”, “Comunista”. As palavras não nos machucam diretamente, mas contém uma potencialidade inquietante, a passagem da intenção ao ato, da agressão verbal à violência física. Resta-nos a indignação, dizer não a esta deriva autoritária, expor sua arrogância e falsidade.

A indignação é um sentimento de repulsa, retira-nos da passividade, recorda-nos que o presente é frágil e as conquistas que conhecemos nada têm de perenes, permanentes.

Renato Ortiz

10 setembro de 2015

13 Comentários

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13 Respostas para “Carta do professor Renato Ortiz após cartaz fascista ameaçar alunos, professores e funcionários do IFCH

  1. Nicolau

    Os covardes comunas estão vendo “fascismo” por todos os lados! Então a Rússia e Europa do Leste em 1989, que derrubaram a criminosa Elite Socialista do Capital-Comunismo e matou porcos comunistas, como o vagabundo “operário” e ditador Ceausescu na Romênia que foi fuzilado, são “fascistas”! Vai ser subdesenvolvido assim no inferno! Morte ao comunismo!

    • Quanta ignorância, Nicolau. Sua comparação não faz o menor sentido. Seu comentário apenas confirma as palavras do Renato Ortiz. Obrigado pela contribuição.

      Att.

      RB

  2. loveneza

    Te

    Olha o Renat Ortiz aí de novo. Nunca mais tive notícia dele. Como está o passeio. Na Bahia não tem erro é sempre bom.

    Bjos

    Enviado do meu smartphone Samsung Galaxy.

  3. Para quem acha que é um exagero e, como disse o Nicolau, que se está buscando enxergar fascismo em qualquer coisa, vejam o que está acontecendo em Niterói, por exemplo: http://www.revistaforum.com.br/blog/2015/09/cartazes-ameacando-negros-gays-e-muculmanos-sao-pregados-em-niteroi-no-rj/

    Para mais fotos dos cartazes fascistas espalhados pela cidade, ver: https://www.facebook.com/correiodorio/photos/a.1509311979358561.1073741827.1505542173068875/1633695350253556/?type=1&theater

    Att.

    RB

  4. EDU

    Acredito que o artigo retrata de fato uma realidade da sociedade brasileira atual. Só faltou explicar que isto é de ambos os lados. Nos anos FHC, a bússola era do outro lado. Desde LULA, por estar no poder e não haver um bolivarianismo explícito no Brasil, a esquerda ficou “calma”. Após o governo Dilma, há de fato um radicalismo a direita, assim como críticos totalmente legítimos que não entram nessa baixaria. Há também uma maior intransigência de ambos os lados e que nas eleições chegou a afetar relacionamentos pessoais. Com a reeleição de Dilma , este processo esta pior. Seja pelo longo prazo do PT no poder, seja pela crise econômica, seja pelo discurso do PT e principalmente o discurso de Dilma na campanha, fizeram com que os animos se exaltassem.

    • Caro Edu,

      Como disse minha orientadora, outro dia, isso é um dos indicadores mais claros da pequena movimentação de estruturas promovida pelos governos de Lula e Dilma nos últimos anos. Diante da possibilidade de amargar outros tantos anos, a direita está reagindo e movimentando suas hostes não só para derrubar a representante legitimamente eleita, mas amedrontar o eleitorado que tem votado no PT, ainda que um tanto à contragosto. Enfim, tudo isso é decorrência, em grande parte, do movimento partidário de grupos que não conseguem se colocar como alternativa viável para o país (ser eleito democraticamente) e, ao mesmo tempo, que não aceita as derrotas nas urnas.

      Att.

      RB

      • EDU

        Rogério. Primeiramente, vc parte de um pressuposto que eu não considero ( pequena movimentação de estruturas promovida pelos governos de Lula e Dilma nos últimos anos). Trata-sede um conceito histórico marxista , que para mim é religioso e deve ser visto no seu campo e não como verdade para o conjunto da sociedade .A direita tem sim o direito de criticar e até derrubar um governo que agiu ilegalmente ( Petrolão e Bicicleta ) ou desastradamente agiram segundo preceitos que acreditaram e quebraram o estado. O que a Direita não pode fazer é dar golpe ou usar a força, mas criticar e até tentar derrubar o governo pelos meios legais ( impeachment, procedido de provas que provam ações ilegais). Mais ainda, não acredito que haja no campo da esquerda ou nos apoiadores do PT, um ÚNICO SER que acredite que o discurso da eleição da candidata Dilma não foi mentiroso e estelionatário. O PT , quando na oposição, sempre foi o mais feroz oposicionista e tentou sem nenhum elemento derrubar o governo FHC ( lembra do FORA FHC pixado no país inteiro e palavra de ordem central do PT e dos seus dirigentes). A conduta da economia por parte de DILMA e Mantega nos anos 2011-2014 foi criminosa e todos pagaremos por isso. Hoje sabemos porque o PT votou contra a lei de Responsabilidade Fiscal. O que concordo com o artigo é que há uma radicalização de intolerância no nível pessoal. Pessoas diminuindo amizades porque o amigo ou colega é Petista ou Reaçionário ( na visão de cada um) , pessoas desprezando 100% a esquerda ou até falando como se os comunistas não pudessem ter sua expressão e ídem do lado da esquerda que desconsidera qualquer idéia, ponto de vista ou fala de alguém que não considere do seu campo, taxando-os de Coxinha, Reaça, Direita, Golpistas, PIG e etc….Isto sim é lamentável e este ponto deve sim ser combatido. Deve haver embate de idéias e de projetos, porém sem desqualificar o interlocutor. Quanto a crítica a política e a economia, o debate e as críticas sempre são bem vindas

      • Uma pena você não enxergar as mudanças estruturais ocorridas no Brasil nessa última década. Pior ainda é você considerar “conceitos históricos marxistas” como religiosos e achar que isso deve ser discutido no campo da religião. Só demonstra o seu despreparo para um debate sério como o que, paradoxalmente, você diz estar disposto a realizar.

        Infelizmente, caro Edu, Golpes de Estado não são perpetrados apenas pela força. O que estamos testemunhando desde a vitória de Dilma nas últimas eleições, é uma tentativa de derrubada da presidenta legitimamente eleita de modo inconstitucional, como já disseram ministros e ex-ministros do STF como Ayres Britto e Teori Zvascki, pra ficar apenas nestes.

        A crise econômica vivida no país não pode ser vista de maneira isolada do resto do mundo. Tal perspectiva faz parte de uma estratégia da oposição raivosa, essa mesmo que não aceita a derrota nas urnas, justamente para perpetrar o golpe que tiraria Dilma e seu partido do governo. Talvez o que esteja falta para essa canalha seja, ainda, decidir como levar junto Temer, Cunha e Calheiros para que rapidamente sejam convocadas novas eleições que, a propósito, também deve vetar a participação do ex-presidente Lula, caso contrário, ainda correm o risco de perdê-la nas urnas.

        Quanto a você tentar levar ao PT um comportamento que hoje se vê no PSDB, vejo apenas como uma manobra desesperada para tentar justificar o comportamento desse partido inescrupuloso. Não me lembro de nenhuma tentativa institucional movida por petistas de abrir processo de impeachment contra o governo do FHC. O que houve, isso sim, foram pixações da militância na rua, o que são coisas bastante distintas no meu entendimento. Atualmente, vemos uma articulação bastante clara dos principais líderes tucanos, inclusive de Aécio Neves (o derrotado), para viabilizar o impeachment e novas eleições. Tanto e tão evidente, que isso virou piada nacional nas redes sociais.

        A cada dia vemos o acirramento das posições contra pessoas que defendem os valores da esquerda. Não me refiro apenas à elementos do governo e movimentos sociais (como Dilma, Lula, Mantega ou Stédile, por exemplo), mas à cidadãos comuns como a professora aposentada da Unicamp, autora do livro Vozes do Bolsa Família, que foi atacada por seu vizinho ou, ainda, o ciclista que foi ameaçado pelo motorista de um carro que, aos brados, o chamava de comunista. O caso que o prof. Renato Ortiz.chama atenção, portanto, não é único.

        Att.

        RB

      • EDU

        Rogério. Por partes
        1) O seu texto fala “da pequena movimentação de estruturas promovida pelos governos de Lula e Dilma nos últimos anos.” Eu não discuti as mudanças estruturais da sociedade. O que acho é que o marxismo é religioso a medida em que ele acredita numa verdade histórica e inexorável e das fases de cada sociedade e seu MP. Este tipo de categoria só se insere no universo marxista.
        2) Se vc não lembra de nenhuma tentativa de impeachment pelo PT e aliados no governo FHC, lhe digo que foram 17, sendo 1 delas proposta por nada menos que Tarso Genro.Já o PSDB só pediu 1 x contra Lula e 1 contra Dilma. As demais foram partidos pequenos. Não foram só os militantes né?
        3) Por incrível que pareça o maior crítico do impeachment é o ex-presidente FHC.
        4) Não acho que querer o impeachment baseado em práticas ilegais seja o final do mundo.
        5) Sobre a não aceitação da derrota nas urnas, acho que vc tem uma certa razão, mas não há dúvida que a campanha foi baseada numa propaganda mentirosa e enganosa. Com certeza foi este discurso mentiroso colocando na oposição ações que o próprio governo Dilma esta fazendo ( cópia da estratégia do Collor quando acusou Lula de querer bloquear a poupança). Há um desgaste muito grande do governo PT, seja pela situação do país, independente da origem ( assim como de FHC em 2001-2002) e também pela operação lava-jato e outras denúncias.
        6) A função da oposição é criticar o governo. na prática, o governo PT ficou sem oposição por 10 anos e se acostumou mal. O arranjo no congresso funciona quando tudo vai bem, quando começa a virar este arranjo muda de lado, assim como se o Lula se candidatar e ganhar, o que é bem possível, aí a gangorra volta para o lado dele e possivelmente ele poderá governar a sua maneira.
        7) Acho lamentável esse acirramento de posição, especialmente quando vai a raias do absurdo descritas por vc e outras. Ficaparecendo futebol.

      • Edu,

        Me referia a pedidos de impeachment sem razão, isto é, pedidos inconstitucionais como o que estão fazendo agora.

        O PT, na verdade, tentou o impeachment de FHC em quatro oportunidades: duas por Milton Temer, uma por José Genoíno e outra por Orlando Fantazzini. O Tarso Genro não fez pedido de Impeachment, mas sim solicitou a renúncia de FHC em seu segundo mandato.

        No entanto, cabe lembrar que uma coisa é fazer o pedido ou a denúncia, outra coisa é o processo ser efetivamente aberto. Se não me engano, todos os pedidos anteriores desde o impeachment de Fernando Collor foram arquivados, com exceção desse último que está sendo estudado pelo Eduardo Cunha e que foi aberto pelo líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (PSDB-SP), junto com outras figuras como Hélio Bicudo e Miguel Reale. Entretanto, como deixei claro, os principais juristas do país não enxergam nenhum crime e nenhuma razão para a abertura de tal processo. Por isso, consideram-no inconstitucional.

        Portanto, o pedido de impeachment ora sob análise de Cunha trata-se muito mais de uma disputa política do que de um pedido calcado nos princípios jurídicos que norteiam a destituição de um presidente legitimamente eleito.

        Att.

        RB

      • Em tempo, quem falou de marxismo foi você. Eu estava falando da pequena movimentação estrutural promovida pelos governos petistas nos últimos 13 anos através, principalmente, da entrada de classes trabalhadoras nas principais universidades do país, e da ascensão social de milhões de brasileiros, fazendo com que a classe média tivesse que dividir espaços antes apenas acessíveis a ela, com as classes trabalhadoras. Aqui não me refiro apenas às universidades, mas também à viagens internacionais, restaurantes, hotéis, praias, etc. A reação dessa classe média, como sempre, foi de ódio e repulsa, como deixou claro artigo de Danuza Leão sobre a possibilidade de encontrar o filho do porteiro em Nova York (http://www.pragmatismopolitico.com.br/2012/12/danuza-artigo-desculpas-ascensao-social-pobres.html) ou, se preferir, o caso mais recente da classe média carioca que não aceita dividir as praias da zona sul com os moradores da periferia do Rio de Janeiro.

        Deixo claro, portanto, que nem estava entrando no mérito do marxismo quando escrevi minha primeira resposta ao seu comentário.

        Att.

        RB

      • EDU

        Rogério.
        Sobre impeachment estamos esclarecidos. Sobre a reação de parte da classe média a ascenção da nova classe média, isto é normal e ocorre basicamente em todas as sociedades. Vc atribui a um ato do PT e eu atribuo a um processo de evolução do país que já passou por isso em diversoso momentos : Italianos no início do séx XX e a urbanização, a industrialização dos anos 40/50/60 que criou um nova classe média, a ascenção novamente de uma imensa nova classe média durante o regime militar e assim por diante. Não houve “jeany é um gênio”. Não foi o LULA que fez muita gente viajar de avião, mas diversas situações que permitiram que aviões se tornassem mais baratos e virassem opção , alem da demografia ( envelhecimento da população, num primeiro momento significa + renda), ações positivas de consumo do próprio governo, uma fase espetacular de dólar baixo e commodities em alta , um aumento gigantesco da formalização/arrecadação com a expansão do uso do cartão de crédito; enfim inúmeros fatores. Este processo acredite acontece até entre os mais pobres. Outro dia uma pessoa falou para mim que sempre ganhou X salários mínimos e agora ganha menos e que daqui a pouco até o faxineiro vai ganhar igual a ele. não é da direita/esquerda. É do ser humano. Para piorar, no Brasil temos a mentalidade desde a escravidão de que há donos no país e o povo não vale nada. Esta mentalidade é difícil de mudar. Há um abismo entre os mais pobres e menos escolarizados e a classe média/alta.Há uma grande dificuldade de se relacionar horizontalmente.

  5. EDU

    Quanto ao RIO, a sua afirmação é preconceituosa ao contrário. O sujeito vai a praia e é assaltado. Claro que ele esta insatisfeito e quer reagir. Não tem nada de dividir a prais. Não sei onde vc mora, mas imagino que vc ia adorar a cada vez que tem uma atividade de lazer, um bando te atacar.

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