Apenas a elite de São Paulo e do país tem acesso à USP

por Nadine Nascimento
publicado originalmente em Brasil de Fato | 04.jan.2016

Hugo Nicolau, aluno de geografia, elaborou estudo sobre composição racial da instituição. Pesquisa demonstra que negros são maioria apenas entre trabalhadores terceirizados na universidade.

USP

Divulgação/USP

“A Universidade de São Paulo é branca, seus alunos e professores são brancos, os negros são minoria na USP. Os negros só são maioria entre os funcionários terceirizados da limpeza, segurança, alimentação, com condições de trabalho precárias, atraso de salários e outras ilegalidades denunciadas inúmeras vezes pelos funcionários e pelo Sindicato dos Trabalhadores da USP”, diz estudo que retrata a distribuição espacial de negros na Universidade de São Paulo.

Onde estão os negros na USP?” publicado no blog “Desigualdades Espaciais”, é um conjunto de mapas que apresentam a distribuição racial na instituição. Feito pelo estudante de geografia Hugo Nicolau, o estudo constatou que o número de negros na Universidade de São Paulo é ainda muito desproporcional em relação a sociedade em geral.

Através da análise de dados do vestibular da Fuvest, da prefeitura de São Paulo e do IBGE, Nicolau distribuiu por cor a comunidade da USP no mapa da universidade.

Em 2010, 77% dos alunos que ingressaram na universidade eram brancos, 10% pardos, 10% asiáticos e apenas 2% eram pretos.

“Em todos os cursos, com exceção da geografia, tem mais asiáticos do que negros. Os asiáticos correspondem a 1% da população de São Paulo, os negros são 34%, e na USP a quantidade de negros, pardos e pretos, se equivale a de asiáticos”, diz Nicolau.

Ainda que todas as universidades federais do país e algumas estaduais tenham implementado o sistema de cotas, a USP reluta em implementar o programa que reserva vagas para negros e conta apenas com uma bonificação na nota final.

O Inclusp e o Pasusp dão um acréscimo de 15% na nota da Fuvest para alunos do ensino público e 5% a mais se o estudante estiver incluído “no grupo PPI” – raça ou cor preta, parda ou indígena.

Para Nicolau, “um bônus de 5% no resultado final do vestibular é insignificante, pois não é suficiente para igualar o nível de quem teve um ensino fundamental e médio deficientes com quem sempre estudou nas melhores escolas”.

“A minha conclusão é que essas políticas de inclusão são só para mostrar que existem, mas elas não funcionam. A relutância em implantar o sistema de cotas está no fato de ser uma universidade elitista, assim, apenas a elite de São Paulo e do país tem acesso à USP”, conclui o estudante.

Ainda segundo o estudo, dos dez cursos mais concorridos do vestibular da instituição, 6 deles não possuem nenhum negro. Para tentar mudar esse quadro, grupos como Ocupação Negra e a Frente Pró-Cotas cobram da universidade um posicionamento positivo em relação ao sistema de cotas.

O Ocupação Negra, criado em 2015, realiza intervenções durante as aulas e a ideia, segundo Marcelo Moreira, é “primeiro fazer a denúncia do racismo institucionalizado e cobrar de maneira forte da instituição, dos professores e dos alunos de que a gente precisa das cotas raciais como uma ferramenta de ação afirmativa para modificar essa situação. Queremos cotas raciais, e quando falamos isso, a gente quer o ingresso de no mínimo 35% de alunos negros na USP.”

Moreira critica o fato da universidade ter se tornado “um centro de poder e um privilégio para poucos”. Para ele, “desde de sua criação, a USP era destinada para uma elite branca, para que esta tenha a dominância intelectual do nosso país. Nesses 80 anos isso só cristalizou. Há uma forte resistência dessa elite para que haja a manutenção desses privilégios”.

10 Comentários

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10 Respostas para “Apenas a elite de São Paulo e do país tem acesso à USP

  1. Grande mentira: meu pai é filho de uma dona de casa e de um marceneiro e fez Farmácia-USP; minha esposa é filha de uma costureira e de um taxista de Carapicuíba e fez Poli-USP.

    • Então, Donaldo, acho que a matéria não está falando das exceções. Você percebeu? Os indicadores revelam a presença de uma minoria que não pertence à elite, no entanto, a grande maioria continua sendo da elite paulista e brasileira. É disso que se trata.

      Att.

      RB

      • Há uma grande confusão aqui: curso superior não foi feito para refletir a MÉDIA. Curso superior foi feito para que os melhores sejam médicos, engenheiros, advogados e – por quê não? – historiadores.
        Não faz sentido em uma população de mil pessoas termos 300 médicos, 400 advogados e 300 engenheiros.
        Para começo de conversa, em mil pessoas não há mil pessoas habilitadas a serem 300 médicos, 400 advogados e 300 engenheiros.
        A maior das pessoas SIMPLESMENTE quer algo mais simples, como ser porteiro, doméstica ou tirador de xerox.
        O que é CERTO: quem é bom terá o direito de fazer curso superior. E é isto que vi na USP: quem é bom passou em um vestibular justo. Das mil pessoas, 3 médicos, 1 advogado, 4 engenheiros e um historiador (você).

  2. EDU

    Tenho várias observações a respeito:
    1) Duvido que 34% da população de SP seja negra ( não sei se estado ou cidade; não especifica). No Estado com certeza não o é. Na cidade, provavelmente não, mas há um problema metodológico que é esta separação de negro e pardo. Considerar 34% entre negros e pardos, acho bastante provável, talvez até mais.
    2) Em todos os países do mundo existem Universidades que tem uma função de vanguarda, ou seja , pegar os melhores alunos e professores para desenvolvimento e criando uma massa crítica para formação de pesquisadores de alto nível.
    3) Na minha opinião cabe cotas com bônus para bons alunos de escolas públicas , pois não desvirtua o objetivo específico de algumas Universidades ( USP, UNICAMP. parte da UNESP, parte de algumas Federais) , na medida que seleciona bons alunos que em tese terão pouca dificuldade de acompanhar o ( suposto) nível alto dos cursos.
    4) Sou contra cota racial , na medida que no Brasil há o mulato com suas milhares de tonalidades , uma característica que diferencia o Brasil da maioria dos países. Difícil uma família não ter mistura de brancos, mulatos e negros. Criar uma divisão aí, na minha opinião é um problema. Claro que para os ativistas dos movimentos isto é heresia.
    5) Concordo que é estranho que as principais Universidades do país não tenham uma participação proporcional da população, mas isto mostra exatamente as exageradas desigualdades brasileiras. Só não sei se artificialmente isto mudará.Temos que mudar para valer o ensino fundamental para que pessoas de todos os extratos possam concorrer as melhores Univerisdades. Este é o grande desafio.

  3. EDU

    Agradeço os links, mas não poderei ler no curtíssimo prazo. Um dos pontos que coloquei não tem a ver com cotas raciais, mas com a função de algumas Universidades. Observe que o governo federal fez as cotas, mas não conseguiu aprová-las no ITA. Antes da USP, vamos discutir o ITA. Vc acha que o ITA deveria ter cotas? Porque sim ou não? Vou colocar a minha opinião de forma sucinta. Por se tratar de uma faculdade de alto desempenho, não cabe cotas porque o que se espera ao longo do curso é o máximo de cada um ( é mais fácil entrar do que sair) e o mesmo nível geral dos alunos.Serão engenheiros aeronáuticos e não há como formar um profissional que tenha tido qualquer tipo de proteção, porque é um setor que basicamente não admite erros. Em tese uma pessoa que entrou por cota e não tem o nível mínimo exigido, não acompanhará o curso. A USP já permite cotas ( divergimos no tipo de cotas) , mas não há dúvida que na POLI e na Medicina ( menos) , ha´certa similaridade com o ITA.

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